LENDO O LIVRO DA VIDA

O genoma humano – também conhecido como o Livro da Vida, o Manual do Homem, o Código dos Códigos – contém riquezas de valor inestimável. Mas deve-se dizer que é uma leitura muito entendiante, afinal a leitura de mais de 3 bilhões de letras não pode deixar de ser aborrecida. Um gene médio ocuparia cerca de cinco páginas de um livro. O DNA de um cromossomo médio requereria cerca de duzentos livros em uma biblioteca com 4 mil exemplares. Em outras palavras, levaríamos uma vida inteira para escutar uma recitação integral da sequência do genoma.

Pode-se imaginar melhor a sequência do DNA humano como uma enciclopédia gigantesca. Essa enciclopédia tem 24 volumes, que são os nossos cromossomos. Todos nós possuímos 23 pares de cromossomos, sendo cada integrante do par herdado de um de nossos pais. Vinte e dois pares são convenientemente numerados de 1 a 22 e são conhecidos como os autossomos. O par 23 são os cromossomos sexuais. As fêmeas têm dois cromossomos X e os machos têm um cromosssomo X e um cromossomo Y. Como a informação guardada nesses volumes é preciosa, a natureza providenciou duas cópias idênticas contendo a mesma informação, mas uma é escrita da esquerda para a direita; e outra, da direita para a esquerda. Cada volume inclui vários capítulos, que são os genes. As sílabas das palavras são escritas com uma combinação de três letras (códon), entre as quatro letras que compõem o alfabeto de toda a enciclopédia. As quatro letras do alfabeto do DNA são compostos químicos chamados nucleosídeos, os quais são formados por uma combinação de três substâncias químicas, das quais a mais importante é chamada base nitrogenada. Existem vários tipos de bases nitrogenadas na natureza, mas apenas quatro compõem o nosso DNA: adenina, citosina, timina e guanina, referidas respectivamente como A, C, T e G.

Essas letras formam pares, de forma que cada letra presente numa palavra é representada pelo seu par na mesma palavra escrita de traz para frente no volume complementar (fita complementar de DNA). Assim, o C sempre faz par com o G, e o A com o T. Nas nossas células, os dois volumes complementares de informação genética são encadernados e guardados juntos para formar os cromossomos. A encadernação é feita pela interação dos pares de base presentes nos dois volumes, o que faz com que o DNA tenha uma forma física espiral parecida com um fio de telefone. Essa estrutura é composta por duas hélices que se complementam mas são antiparalelas, já que uma delas está escrita da esquerda para a direita; e a outra, da direita para a esquerda. Como nesse formato o DNA seria muito grande para caber no núcleo de uma célula, a natureza criou maneiras de organizar a dupla hélice de uma forma muito compacta. As cadeias do DNA em cada célula são firmemente enroladas e condensadas milhares de vezes dentro do núcleo, de modo que o espaço entre cada letra no código genético é de 0,34 nanômetros – menos de uma bilionésima parte de um metro. Nessa forma, o DNA é espremido e guardado dentro do núcleo das células, num espaço com cerca de 0,005 milímetro de diâmetro. Entretanto, quando completamente estendido, o DNA de uma única célula se desdobraria por cerca de dois metros. Para ilustrar, no espaço ocupado por um sinal de ponto final desse texto caberiam cerca de duzentas células, ou quatrocentos metros de DNA. Então, a quantidade total de DNA nos 100 trilhões de células que compõem o corpo humano, se estendida de ponta a ponta, faria o percurso de ida e volta ao Sol umas vinte vezes.

De tempos em tempos, as células do nosso organismo se duplicam num processo que os cientistas chamam de divisão celular. Nesse processo, uma célula-mãe gera duas células-filhas através da divisão ou duplicação de tudo que ela contém, inclusive seu DNA. Para que isso possa acontecer, a célula desencaderna os dois volumes de cada cromossomo, fazendo com que as fitas de DNA antiparalelas sejam separadas. A seguir, cada uma dessas fitas é utilizada como molde para produzir uma fita-filha; ou seja, um novo volume. Ao final do processo, as fitas mãe e filha são encadernadas juntas para gerar um novo volume composto de uma fita original (a fita que serviu de molde) e de uma fita nova (a fita recém-produzida). A característica de sempre copiar uma das fitas e mantê-la junto à fita-filha é chamada de semi-conservação e garante que cada nova cadeia de DNA produzida seja idêntica à original (mas escrita de traz para frente), de forma que as instruções genéticas possam ser preservadas e passar sem erros para cada célula filha.

“A MOLÉCULA DE DNA
A MOLÉCULA DE DNA
A MOLÉCULA DE DNA
É o Nu descendo uma escada
Circular.
Ver as superfícies
Sob os degraus
Da espiral e
Os espaços
No meio.”

De “A Molécula de DNA”, May Swenson